quinta-feira, 18 de junho de 2009

PRINCÍPIOS DE VENTILAÇÃO MECÂNICA

Definição
A ventilação mecânica ou o suporte ventilatório, é um método de suporte para o tratamento de pacientes com insuficiência respiratória aguda ou crônica agudizada e pacientes submetidos a anestesia geral para intervenção cirúrgica.
Consiste de um dispositivo automático conectado as vias aéreas destinado a levar volume de gás aos pulmões com o objetivo de aliviar total ou parcialmente o trabalho respiratório do paciente, promovendo as trocas gasosas e a manutenção de um suporte respiratório eficiente para a manutenção da vida.
Os ventiladores mecânicos podem realizar sua função aplicando uma pressão positiva nas vias aéreas (ventilação com pressão positiva) ou gerando uma pressão subatmosférica ao redor do tórax (ventilação com pressão negativa). Neste resumo será abordada somente a ventilação com pressão positiva.
A compreensão dos modos ventilatórios e sua correta utilização são fundamentais para a escolha adequada do modo ventilatório a ser utilizado em cada situação clínica, evitando lesões pulmonares que podem ser tão ou mais graves que aquelas que justificam seu uso.

Classificação
Atualmente o suporte ventilatório pode ser classificado em dois grupos:
  • Ventilação Mecânica Invasiva;
  • Ventilação Mecânica Não-Invasiva.
Nestas duas formas a ventilação se dá através do uso de pressões positivas, o que as difere é a forma de liberação desta pressão.
Na ventilação invasiva esta se dá através de um tudo oro ou nasotraqueal ou uma cânula de traqueostomia. Na ventilação não-invasiva utiliza-se máscara como interface entre o paciente e o ventilador.

Princípios
A ventilação mecânica se da através da utilização de aparelhos que agem de forma intermitente insuflando as vias respiratórias com volumes de ar. O movimento do gás para dentro dos pulmões ocorre devido à geração de um gradiente de pressão entre as vias aérea superiores e o alvéolo, podendo ser conseguido por um equipamento que diminua a pressão alveolar (ventilação por pressão negativa) ou que aumente a pressão da via aérea proximal (ventilação por pressão positiva).
Neste ar podemos controlar a concentração de O2 necessária para manter uma saturação acima de 90%. Controla-se também a velocidade com que o ar será administrado (Fluxo inspiratório - V), e define-se a forma de onda deste fluxo, ou seja, na ventilação com volume controlado esta onde poderá ser “descendente”, “quadrada”, “ascendente” ou “sinusoidal”.
O número de ciclos respiratórios que os pacientes realizam em um minuto (freqüência respiratória - f) será conseqü¬ência do tempo inspiratório (TI), que depende do fluxo, e do tempo expiratório (TE). O TE pode ser definido tanto pelo paciente (ventilação assistida), de acordo com suas necessi¬dades metabólicas, como através de programação prévia do aparelho (ventilação controlada). O produto da f pelo VT é o volume minuto.

Indicação
O critério para a utilização da ventilação mecânica varia de acordo com o objetivo que se quer alcançar e com a necessidade clinica do pacientes, que pode ser observada através dos exames clínicos e laboratoriais.
As principais indicações para o suporte ventilatório mecânicos são:
  • Reanimação por parada cardiorrespiratória;
  • Hipoventilaçao e apnéia;
  • Insuficiência respiratória devido à doença pulmonar previa e hipoxemia;
  • Falência do aparelho respiratório, seja por fraqueza muscular, doença neuromuscular ou fadiga; ou por alteração no comando respiratório.
  • Prevenção de complicações respiratórias no pós-operatório de cirurgia de abdome superior ou torácica.
  • Diminuição do trabalho muscular respiratório.

Alinhar ao centro
III Consenso de Ventilação Mecanica


Ciclo Ventilatório
O ciclo ventilatório da ventilação mecânica pode ser dividido em 4 fases:
  • Fase inspiratória: que corresponde a fase em que o ventilador realiza a insuflação pulmonar, vencendo as propriedades elásticas e resistivas do sistema respiratório. Ao final da insuflação pulmonar uma pausa inspiratória poderá ser utilizada para prolongar esta fase de acordo com as necessidades clínicas de melhorar a troca gasosa. Nesta fase a válvula inspiratória encontra-se aberta;
  • Mudança de fase (ciclagem): o ventilador irá interromper a fase inspiratória (após a pausa inspiratória, quando esta estiver sendo utilizada), momento de transição entre a fase inspiratória e a fase expiratória. Existem vários modos de ciclagem, pressão, fluxo, volume e tempo;
  • Fase expiratória: Corresponde ao fechamento da válvula inspiratória e a abertura da válvula expiratória, permitindo o esvaziamento dos pulmões, sendo que a força motriz para esta ação é a própria pressão dos gases no interior do pulmão, o que gera uma exalação passiva;
  • Mudança da fase expiratória para a fase inspiratória (disparo): esta fase compreende o final da expiração com fechamento da válvula expiratória e abertura da válvula inspiratória (disparo). Essa transição pode ser feita pelo ventilador ou pelo paciente, permitindo o início de uma nova fase inspiratória. O disparo pode ser a tempo, pressão ou fluxo.

Análise de gráficos da ventilação mecânica

Curva de Fluxo
O fluxo é medido pelo ventilador através de sensores de pressão posicionados entre a cânula endotraqueal e o “Y” do circuito do ventilador. O fluxo é iniciado, nos modos controlados, depois de um intervalo de tempo (que depende da Fr ou da relação I:E) ou através de um limite de sensibilidade (trigger ou disparo).
Após o início do ciclo o fluxo aumenta até atingir um valor pré-fixado, chamado de Pico de Fluxo. Este valor é definido pelo operador no modo volume controlado e pode ser mantido constante ou ter valor decrescente no tempo. O fluxo nesta modalidade determina o tempo que a válvula inspiratória permanecerá aberta (TI), de acordo com o volume corrente pré estabelecido.
As formas de onde de fluxo podem ser modificadas diretamente no ventilador ou através do modo ventilatório escolhido. As formas de onde de fluxo disponíveis são: quadrada, ascendente, descendente ou sinusoidal. Sendo que as mais utilizadas são a quadrada (para cálculo da mecânica respiratória) e a descendente (proporciona melhor distribuição do ar inspirado).

Curva de Pressão
A pressão também é medida através de um transdutor localizado próximo ao tubo endotraqueal (“Y” do circuito do ventilador). `
À medida que o fluxo de are entra no sistema respiratório, a pressão inspiratória se eleva, vencendo os componentes resistivos e elásticos. Esta pressão atinge seu volume máximo quando os pulmões atingem sua capacidade máxima de distensão. Após esta fase a válvula expiratória se abre permitindo a exalação. A pressão expiratória pode ser mantida acima da pressão atmosférica, pelo controle da válvula de exalação que poderá ser ajustada para impedir a saída total do volume de gás do interior dos pulmões, gerando assim uma Pressão Positiva Expiratória Final (PEEP).

Curva de Volume
No gráfico de volume podemos observar o volume inspirado através de uma curva ascendente, e o volume de ar expirado representado por uma curva descendente. Os volumes normalmente são inalterados, a não ser nos casos de vazamento, desconexão do circuito ou aprisionamento de ar.

Modos Ventilatórios

Ventilação Controlada
Modo ventilatório onde não há participação do pacientes, o ventilador comanda todas as fases da ventilação. A inspiração é determinada de acordo com um critério de tempo, resultado do ajuste da freqüência respiratória.
T= (60/freqüência) – Tinspiratório
Na maioria dos ventiladores, quando se ativa o comando “ventilação controlada” todos os demais mecanismos de disparo e o comando “sensibilidade” ficam, desativados.
Nesta modalidade ventilatória é possível realizar o cálculo de complacência e resistência pulmonar, possibilitando assim um controle efetivo das condições ventilatórias do pacientes, tanto para avaliação de mudança dos parâmetros ventilatórios, como para acompanhamento de sua evolução para o processo de desmame.
Indicação: Esta modalidade esta indicada para pacientes que apresentam diminuição do estímulo respiratório, como nos casos de fadiga muscular, disfunção neurológica, apnéia e pós recuperação cardiopulmonar e cerebral. Também é utilizado na presença de instabilidade torácica, nos casos de anestesia geral e para manipulação da ventilação alveolar.

Ventilação Assistida
Neste modo ventilatório o início da inspiração é determinado pelo ventilador, que usa um critério de pressão ou de fluxo, porém o ciclo só inicia quando o aparelho reconhece um esforço do paciente.
Através de uma sensibilidade pré programada o esforço respiratório do paciente aciona o aparelho permitindo assim o disparo do mesmo.
Quando o critério utilizado for pressão, o aparelho detecta uma queda da pressão expiratória no circuito, se o critério for fluxo o aparelho detecta uma movimentação de ar em direção ao paciente, permitindo o inicio de um novo ciclo.
A freqüência respiratória e o tempo expiratório são determinados pelo paciente, e o volume corrente é determinado de acordo com a ciclagem escolhida.

Ventilação Assisto-Controlada
Nesta modalidade ventilatória o paciente determina sua própria freqüência respiratória e o seu volume-minuto quando ele é capaz de atingir um limiar mínimo de sensibilidade pré determinada pelo operador. Caso o paciente não seja capaz de gerar um estimulo respiratório espontâneo, este será garantido ao através de uma freqüência de ciclos determinada pela máquina, sustentando assim as trocas gasosas. Portanto o ventilador permite um mecanismo misto de disparo da fase inspiratória: a tempo ou a pressão.
O disparo por pressão é ativado pelo esforço inspiratório do paciente (assistido), enquanto o disparo por tempo é determinado pelo aparelho (controlada), funcionando dessa maneira como um mecanismo de resgate, fornecendo maior segurança ao paciente, pois o ciclo controlado é ativado sempre que o paciente não consegue ativar o ciclo assistido.
Indicação: Esta é a modalidade de primeira escolha para a fase inicial de ventilação mecânica em pacientes com insuficiência respiratória aguda de qualquer etiologia. Sua vantagem consiste em permitir ao paciente que determine sua própria freqüência respiratória e o seu volume-minuto, alem de lhe garantir uma freqüência respiratória mínima prefixada de reserva e o volume corrente. Como desvantagem esta a tendência natural à hiperventilação quando o paciente esta sub dor, estado de ansiedade ou fatores neurológicos, podendo levar a uma alcalose respiratória grave ou ao aprisionamento de ar pela diminuição do tempo expiratório.

Ventilação Mandatória Intermitente Sincronizada
Este modo ventilatório permite a combinação dos modos assistido/controlado com períodos de ventilação espontânea do paciente, isto ocorre dentro do próprio circuito do aparelho e é possível através da presença de um sistema de válvulas de demanda ou flow-by, que funciona como um gerador de pressão constante. Durante o processo de ventilação o aparelho não entra no período em que o paciente esta expirando, ou seja, ele funciona sincronizado com a respiração espontânea do paciente.
Esta respiração espontânea pode ser auxiliada por recursos do ventilador, como o CPAP e a pressão de suporte.
O CPAP age mantendo uma pressão positiva durante todo o ciclo respiratório espontâneo do paciente. Já a pressão de suporte oferta níveis pressóricos positivos durante a fase inspiratória do ciclo, reduzindo o trabalho respiratório. Apesar de ser considerada uma ventilação espontânea, a pressão de suporte é um modo assistido de ventilação, pois é preciso que o aparelho reconheça uma queda de pressão no circuito para ativar a pressão de suporte.
Indicação: Esta modalidade é indicada nos processos de desmame da ventilação mecânica por permitir que a assistência ventilatória seja retirada de forma gradual, possibilitando que o paciente assuma seu ciclo ventilatório gradualmente. Também é indicada para suporte ventilatório inicial de formas severas de insuficiência respiratória aguda.

AUTORA: FTA. ANDRESSA ANDREO


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
  1. Carvalho, Carlos R. -Ventilação Mecânica Vol. I Báscio-, 2000
  2. Diament, Décio - Manual do Curso de Revisão de Medicina Intensiva-, 2004

I Simpósio de Atualização em Ortopedia Técnica da ABBR

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Alteração da pressão intra-cuff do tubo endotraqueal após mudança da posição em pacientes sob ventilação mecânica*

ESTUDO DA PRESSÃO NO BALONETE DE TUBOS OROTRAQUEAIS DE PACIENTES SUBMETIDOS À VENTILAÇÃO MECÂNICA

1. INTRODUÇÃO

A intubação orotraqueal é a passagem de um tubo através da boca do paciente até atingir a traquéia, com o objetivo principal de garantir a permeabilidade das vias aéreas. Ela está indicada em pacientes que apresentem inadequada ventilação ou oxigenação, grande quantidade de secreções brônquicas, ou risco de aspiração de secreção gástrica.
Para a intubação são utilizados, em geral, tubos de plástico que contém na sua porção distal um balonete; este é insuflado por meio de uma extensão proximal que, por sua vez, tem acoplado um balonete de prova (Figura 1).

Figura 1 - Cânula de intubação orotraqueal

As funções básicas do balonete distal são: auxiliar a fixação da cânula na traquéia, impedir o vazamento de ar ao redor da cânula durante a ventilação assistida e prevenir a aspiração de secreção salivar e conteúdo gástrico. A função do balonete de prova é controlar a pressão a ser mantida no balonete distal.
Se pressão do balonete estiver baixa demais não irá impedir a broncoaspiração e nem o escape de ar ao redor da cânula, no entanto, se elevada poderá comprometer a irrigação da traquéia e causar ulceração, hemorragia, fistula tráqueo-esofágica e estenose.
Portanto, é fundamental que a monitorização da pressão do balonete seja feita e mantida em um nível que contemple as necessidades descritas acima. No entanto, o tipo de balonete, o diâmetro da cânula, as técnicas de medida, a possibilidade de difusão de óxido nitroso (N2O) para o interior do balonete, a variação do diâmetro da traquéia com as características físicas dos pacientes, podem interferir na pressão final do balonete sobre a mucosa traqueal.

2. ASPECTOS ANATOMO - HISTOLÓGICOS


A traquéia é um tubo que se situa entre a laringe e os brônquios, e posteriormente tem relação com o esôfago. Em secção transversal da traquéia podemos observar um tubo achatado dorsalmente que apresenta 3 camadas bem definidas: mucosa, submucosa e adventícia. A mucosa é formada por epitélio pseudoestratificado ciliado e por lâmina elástica; a submucosa é composta por tecido conjuntivo denso, irregular e fibroelástico, onde se encontram numerosas glândulas mucosas, seromucosas além de elementos linfóides; a camada adventícia é composta por tecido fibroelástico e sua característica mais importante são os anéis em forma de “C”, de cartilagem hialina com tecido conjuntivo fibroso interposto (GARTNER e HIATT, 1999).
A irrigação da traquéia é feita predominantemente pelas artérias tireoídeas inferiores, as artérias tireoídeas superior e bronquiais. Algumas vezes a artéria torácica interna contribui para esta irrigação.
A inervação se faz por meio do nervo laríngeo recorrente, ramo do nervo vago, e por ramos do plexo pulmonar e simpático (Figura 2).

Figura 2 - Ilustração da inervação, irrigação arterial e drenagem venosa da traquéia (GARDNER, GRAY e O’ RAMILLY, 1988, p.415).


Um aspecto que se deve considerar é o fato de que a rede anastomótica vascular da traquéia está particularmente localizada na camada submucosa, assim, em casos de hiperinsuflação do balonete, as artérias e veias localizadas nesta região serão comprimidas contra os anéis rígidos da porção lateral e anterior da traquéia provocando isquemia que, se não diagnosticada a tempo, pode levar a necrose da região afetada (KNOBEL, 1998) (Figura 3).

Figura 3 – Desenho esquemático da ação do balonete sobre os vasos da camada submucosa da traquéia (KNOBEL, 1998, p. 1602).

A pressão de perfusão da traquéia varia entre 30 e 40 milímetros de mercúrio (mmHg). Portanto para que o balonete permaneça insuflado em contato com a traquéia, evitando escape de ar ou aspiração de material da faringe, sem causar isquemia, sua pressão deve estar abaixo deste valor (MENDES, HINTZ e BREDEMEIER NETO, 1996).
Sendo assim, como medida preventiva de lesões traqueais, deve-se adotar a freqüente mensuração da pressão do balonete, a qual deve ser mantida em patamar inferior a 35 mmHg, para que se permita fluxo sanguíneo capilar adequado para a mucosa traqueal.
Nordin (1977), em estudo experimental constatou que o fluxo sanguíneo na traquéia diminui no local de contato conforme aumenta a pressão dentro do balonete, aproximando-se de zero quando as pressões atingem a valores entre 80 e 120 mmHg.


3. TIPOS DE BALONETES

De acordo com Nordin (1977), os primeiros relatos sobre cânulas de traqueostomia e de intubação orotraqueal são datados no ano de 1871, quando Trendelenburg descreveu a primeira cânula de traqueostomia, já com balonete a ser insuflado para permitir melhor vedação entre a cânula e a parede da traquéia, não permitindo escape de ar.
Os balonetes podem ser classificados de acordo com o volume residual e a pressão interna. Há os de volume residual baixo e alta pressão e os de volume residual alto e baixa pressão (Figura 4).

Figura 4 – Ilustração de um balonete de alto volume (A) e um balonete de baixo volume (B) (NORDIN, 1977, p.14).

Segundo Oliveira e Braccin (2001), os balonetes de volume residual baixo podem gerar uma pressão interna muito alta (180–250 mmHg). A maior parte desta pressão é utilizada na distensão de sua borracha, e uma fração é recebida pela traquéia. À medida que essa fração se aproxima da pressão da porção arteriolar do capilar que irriga a traquéia (35 mmHg), aumenta-se o risco de isquemia da mucosa. Este tipo de balonete deve ser insuflado com uma quantidade média de 4 mililitros (ml) de ar, não devendo ultrapassar a 8 ml.
O balonete desenvolvido por Trendelenburg era pequeno e possuía uma parede espessa, portanto, balonete de baixo volume e alta pressão interna (NORDIN, 1977).
Os balonetes de volume residual alto são preferíveis porque se adaptam de maneira uniforme à mucosa traqueal, com uma pressão interior baixa que, ao ser transmitida à traquéia, não impede a circulação capilar da mucosa circunvizinha. O volume médio de ar a ser insuflado é de aproximadamente 20 ml. (OLIVEIRA e BRACCINI, 2001)
Em 1893, Eisenmenger desenvolveu o primeiro balonete de alto volume com um balonete de prova que indicava a pressão dentro do balonete a fim de evitar lesão da mucosa traqueal (NORDIN, 1977).
A primeira análise prática entre balonetes de baixo ou de alto volume foi feita por Grimm e Knight (1943), eles indicam o uso de balonetes de alto volume que preenchem de maneira eficaz o lúmen da traquéia sem distender além do necessário o balonete (NORDIN, 1977).
Dobrin et al. (1977), da mesma maneira que Oliveira e Braccin (2001), relatam que balonetes de baixo volume são rígidos e geram mais pressão interna do que os balonetes de alto volume, que são mais complacentes. Segundo estes autores, a percentagem da pressão interna do balonete de baixo volume que é transmitida à mucosa traqueal é menor do que aquela transmitida pelo balonete de alto volume, no entanto, como suas pressões internas são maiores, os balonetes rígidos geram mais pressão contra a mucosa traqueal do que os balonetes complacentes. Esta diferença também está relacionada com a facilidade com que o balonete complacente preenche o lúmen traqueal, ou seja, se moldam à forma da traquéia com pouco aumento da sua pressão, enquanto que os balonetes rígidos tendem a manter sua forma redonda e, assim, deformam a traquéia.
Nordin (1977) também afirma que balonetes de parede rígida e espessa, que são os de baixo volume e alta pressão, causam mais ulcerações na traquéia.
Por outro lado, ainda de acordo com Nordin, os balonetes de alto volume e baixa pressão moldam-se à traquéia por terem as paredes finas, flexíveis e complacentes, causando menos lesões.
Segundo Medalha, Oliveira e Godoy (1999), os balonetes com alto volume (mais do que 30 ml) quando insuflados exercem pressão na parede da traquéia próxima de zero, enquanto que balonetes com volume de 3 - 6 ml, ou seja, de baixo volume, podem exercer pressões de até 75–200 mmHg. O uso de balonetes de alto volume e baixa pressão requer pressões menores para permitir a ventilação e evitar aspiração.
De acordo com Aranha et al. (2003) os balonetes de baixa pressão, mantidos com níveis pressóricos que evitam agressões à mucosa traqueal (20 a 25 mmHg sobre a traquéia), podem permitir a passagem de fluído da orofaringe para a parte distal da traquéia, favorecendo complicações infecciosas, traqueobrônquicas e pulmonar. Esta ocorrência se deve a presença de pequenos canais que se formam entre a parede do balonete de baixa pressão e a mucosa traqueal. Segundo Castilho et al. (2003) a formação destes canalículos, pode ser devido à ocorrência de dobras na parede do balonete desinsuflado que não se desfazem durante sua insuflação.
Aranha et al. (2003) descrevem o experimento realizado em 1971 por Cooper e Grillo, em cães, e posteriormente no homem, em que se aplicou tubo traqueal com balonete de látex, facilmente distensível, maleável, que se adaptava ao formato da traquéia e necessitava de menor pressão para evitar escape do fluxo de ar. O desenvolvimento deste tubo de baixa pressão, por meio de recursos da bioengenharia, possibilitou uma redução das estenoses traqueais pós intubação na década de 70, porém, lesões traqueais ainda eram observadas quando os balonetes destes tubos eram insuflados com volume excessivo.
Yuong e Blunt (1999) testaram, em traquéias de porcos, tubos traqueais com balonetes feitos de uma barra de aço e polidos para produzir uma superfície lisa (Figura 5. A). Observou-se que com esse balonete se evitava a passagem de líquidos, com pressão de insuflação baixa (Figura 5. B). Documentaram a passagem de líquidos no balonete convencional de baixa pressão tanto nos animais, como colocando o tubo de intubação no interior de seringa de 20 centímetros cúbicos (cm3). No caso das seringas, colocaram-nas na posição vertical com corante depositado na porção superior do balonete (Figura 5. C). O corante passou entre a parede do balonete convencional e da seringa. Os autores questionaram a necessidade do balonete desenvolvido ter tamanho diferenciado para tubos de maior ou menor diâmetro interno, como os de 9 e 7 milímetros (mm).
Segundo Castilho et al. (2003), uma desproporção entre o diâmetro do balonete e o da traquéia, para mais ou para menos, ou uma parede do balonete que não é fina ou é pouco flexível, predispõe a formação de dobras que irão propiciar a broncoaspiração, como visto anteriormente. Previne-se esta intercorrência mantendo a relação entre o diâmetro do balonete e o da traquéia o mais próximo possível e aumentando a pressão do balonete. Portanto, a escolha do tipo de balonete deve respeitar as características físicas do paciente. Por exemplo, em geral, o homem tem traquéia mais larga do que a mulher.
Klainer et al. (1975), afirmavam que apesar da introdução de uma grande variedade de balonetes de baixa pressão e alto volume, com características e materiais diversos, além do monitoramento da pressão dos balonetes, as complicações ainda continuaram a ser vistas em 6% dos pacientes expostos a intubação.
Portanto, a avaliação criteriosa das características físicas do paciente para a escolha do diâmetro da cânula e a opção de um balonete de alto volume e baixa pressão, ainda não são suficientes para evitar danos à mucosa traqueal derivados da intubação. Estabelecer o tipo de balonete que agrida menos a mucosa traqueal e enfatizar que o excesso de pressão no seu interior deve ser monitorado para evitar complicações são medidas profiláticas que devem fazer parte da rotina hospitalar.
Com o objetivo de diminuir os traumas sobre a mucosa traqueal são descritas técnicas de medida da pressão do balonete, a fim de evitar que se exceda a pressão de perfusão da traquéia e cause lesões devido à isquemia, podendo chegar até à necrose.


4. TÉCNICAS DE MEDIDA DA PRESSÃO DO BALONETE


Como foi visto, o limite de nível pressórico a ser mantido no balonete da cânula orotraqueal é bastante restrito. Variações podem determinar tanto lesão por isquemia (quando acima do ideal) como broncoaspiração (quando abaixo do ideal). As técnicas descritas para monitorização da pressão do balonete visam exatamente atingir este ponto ideal da forma mais fácil possível, de maneira que possam ser aplicadas por qualquer profissional da área da saúde que atue com pacientes intubados, seja em centros cirúrgicos ou em Unidades de Terapia Intensiva (UTI).
A medida da pressão do balonete pode se dar tanto pela palpação do balonete de prova, como pela medida da pressão com manômetro (analógico, de mercúrio ou digital) associada ou não à ausculta de escape de ar.


4.1 Palpação do balonete de prova


Fernandez et al. (1990), estudaram a capacidade de estimativa da pressão no interior do balonete por meio de palpação manual do balonete de prova. Eles insuflaram balonetes de 4 fabricantes diferentes, selecionaram alguns profissionais da área da saúde, entre médicos e enfermeiros, para verificar a pressão dos balonetes através da palpação. Os autores concluíram com este experimento que há uma falta de precisão na estimativa da pressão, isto se deve a diferença entre as propriedades físicas dos tubos (volume e forma), e a falta de experiência ou de habilidade dos observadores de detectar a pressão do balonete pela palpação. Por este motivo, os autores recomendam o uso de manômetros como melhor forma de controlar a pressão do balonete.


4.2 Medida com manômetro associada à ausculta de escape de ar


Mendes, Hintz e Bredemeier Neto (1996), desenvolveram em pacientes com indicação de cirurgia, após serem submetidos à anestesia geral e intubação, uma técnica de mensuração da pressão no interior do balonete por meio do uso de um manômetro de mercúrio. Inicialmente os autores insuflaram o balonete com volume de ar aleatório até vedação da via aérea, após 15 minutos o balonete foi totalmente desinsuflado e nele foi injetado ar ambiente até não se ouvir, com um estetoscópio posicionado sobre a fúrcula esternal do paciente, ruído de escape aéreo. A pressão ideal foi à obtida através do manômetro de mercúrio no momento em que o escape de ar cessou. Os autores observaram que o volume mínimo necessário para oclusão da traquéia não variou entre tubos de calibre 8,0 ou 8,5 mm, e que a pressão do balonete se manteve em torno de 10 a 13 mmHg.
Observaram também que quando se injetou volume três vezes maior do que o necessário para oclusão a pressão no balonete se manteve entre 54 a 55 mmHg. Os autores concluíram que quando se utiliza balonete de baixa pressão, alto volume residual e paredes finas a pressão e o volume mínimo de oclusão são baixos. Eles também recomendam a monitorização do volume injetado e da pressão do balonete para evitar o uso de pressões altas, que são reconhecidamente lesivas à mucosa traqueal.
Aranha et al. (2003) realizaram um estudo semelhante ao anterior, porém, com uso de manômetro digital. Além disso, a ausculta, neste experimento, foi feita por meio do meato acústico externo do próprio examinador junto da boca do paciente.
Os autores formaram dois grupos, o primeiro era composto por pacientes da UTI e o segundo por pacientes intubados para procedimento cirúrgico, nos 2 grupos os balonetes foram esvaziados até ouvir ruído em sopro, caracterizando o vazamento do volume corrente ao redor do balonete. Neste momento o balonete foi preenchido por ar até o ruído desaparecer.
De acordo com os autores, esta manobra determinou a diminuição significativa da pressão no interior do balonete. A média das pressões apresentou redução de 56,2 para 15,5 no grupo 1 e de 85,3 para 26,7 no grupo 2. Aranha et al. observaram que, tanto os pacientes da UTI, como os pacientes intubados para procedimento cirúrgico, mantinham pressões no interior dos balonetes em níveis acima do necessário para adequada ciclagem do respirador sem perda do volume corrente de ar. Portanto, os autores consideraram ser um eficiente método para manter a pressão no balonete inferior a 30 mmHg. Além disso, segundo os autores, a manobra desenvolvida por eles é eficiente, simples, rápida e de baixo custo.


4.3 Medida com manômetro analógico calibrado

Barbosa e Santos (1996), realizaram um estudo com o objetivo de determinar o volume adequado para insuflar o balonete de cânulas de intubação orotraqueal com diferentes diâmetros internos, sempre mantendo uma pressão entre 20 e 30 mmHg.
Insuflaram os balonetes com 10 ml de ar sempre medindo a pressão a cada ml de ar insuflado. As medidas foram feitas com o auxilio de um manômetro analógico (Figura 6) previamente calibrado, unido por um equipo de soro de três vias. Em uma via foi conectado o manômetro, na outra uma seringa de 10 ml com ar a ser insuflado e na última foi conectado o balonete de prova.

Figura 6: Manômetro analógico

Os autores concluíram que para cada diâmetro de cânula de intubação, existe um volume de ar adequado para insuflar o balonete, ou seja, quanto maior o diâmetro da cânula maior o volume de ar para insuflar o balonete.


4.4 Medida com manômetro de mercúrio


Garcia, Romero e Morán (2000), realizaram um estudo com o objetivo de determinar a relação entre a pressão do balonete durante a intubação traqueal, com a ocorrência de dor traqueal após a extubação do paciente.
Foram estudados 40 pacientes de ambos os sexos, intubados para realização de procedimento cirúrgico. Os pacientes foram divididos em dois grupos conforme a pressão aplicada no balonete do tubo orotraqueal, no primeiro grupo (grupo A) de 10 pacientes, a pressão estabelecida foi menor ou igual a 42 mmHg, no segundo grupo (grupo B) de 30 pacientes, a pressão foi maior do que 42 mmHg. Essas pressões foram medidas com um manômetro de mercúrio unido através de um tubo de látex ao balonete de prova.
Os autores observaram que após 60 minutos da extubação, 80% dos pacientes do grupo A e 90% dos pacientes do grupo B apresentaram dor traqueal. Em 24 horas de extubação 10% dos pacientes do grupo A ainda apresentavam dor, e 53.3% dos pacientes do grupo B também se queixavam de dor.
De acordo com Garcia, Romero e Morán, a elevada pressão no balonete pode estar relacionada com a presença de dor traqueal após a extubação. Os autores indicam a implementação de vigilância da pressão no interior do balonete para evitar que esta esteja acima do necessário (30 mmHg).


5. PRESSÃO IDEAL DO BALONETE NA TRAQUEIA

Normalmente, o dano inicial derivado de altas pressões consiste no aparecimento de traqueíte sem ulceração, evoluindo para uma desnudação da mucosa com exposição da cartilagem (FERNANDEZ et al., 1990).
De acordo com Nordin (1977), na década de 40 Grimm e Knight destacaram o risco de isquemia local da mucosa traqueal devido à excessiva pressão sobre a parede traqueal. Após muitas investigações nesta área, conclui-se que a isquemia local é uma causa muito importante de ferimento na traquéia determinada pela intubação (Figura 7).

Figura 7 – Ilustração da pressão do balonete sobre a parede da traquéia, demonstrando a irrigação da traquéia comprimida pelo balonete (modificado - NORDIN, 1977, p.30).
Por outro lado, como vimos anteriormente, problemas relacionados a uma má insuflação do balonete incluem perda de onda de volume fornecido pelo ventilador e microaspiração de secreção da orofaringe o que pode causar infecção pulmonar.
Segundo Fernandez et al. (1990), Badenhorst (1987) mostrou que a insuflação adequada do balonete evita perdas aéreas, porém, podem ocorrer aspirações brônquicas devido à oscilação da pressão negativa intratorácica, principalmente durante a inspiração, o que propicia o aumento do diâmetro da traquéia e a desproporção entre essa e o balonete.
De acordo com Aranha (2003), Guyton, Barlow e Benelievre em 1997, observaram que em pacientes com pico de pressão de inspiração elevada há uma maior possibilidade de se apresentar estenose traqueal, pelo fato de ser necessária uma maior pressão no balonete para se evitar perda de parte do volume corrente.
De acordo com Nordin (1977), a pressão do balonete deve estar no mínimo entre 20 e 25 mmHg para diminuir a movimentação da cânula na traquéia, evitar a aspiração de conteúdo gástrico e evitar o escape de ar durante a ventilação mecânica, e no máximo entre 30 ou 35 mmHg para permitir a perfusão capilar traqueal.
Nordin (1977), demonstrou em coelhos que a pressão no balonete do tubo traqueal acima de 30 mmHg causa isquemia da mucosa e por isso recomendou que essa pressão ficasse abaixo de 20 mmHg.
Em outro experimento com coelhos, Nordin (1977) demonstrou que a pressão entre o balonete e a traquéia é causa mais importante de danos do que o tempo de intubação. Segundo ele, em pressões de 100 mmHg o dano traqueal pode ser observado após 1 hora, com significativa destruição da mucosa, perda ciliar e início de processo inflamatório. Em intubação com pressão de 20 mmHg o dano só pode ser considerado significativo após 3 horas de intubação, e é caracterizado por perda de cílios em algumas células, porém com preservação da integridade citoplasmática.
Oliveira et al. (1994), relatam que Bernhard (1979) em seu experimento, também observou que pressão mantida acima de 50 mmhg, durante 15 minutos, pode causar destruição do epitélio colunar deixando visível à membrana basal.
Segundo Dobrin et al. (1977), balonetes rígidos exigem pressões internas de 320 mmHg a 360 mmHg, para selar o lúmen traqueal, enquanto balonetes mais complacentes exigem pressões de 20 a 40 mmHg.
Barbosa e Santos (1996), também alertam para a necessidade de se manter a pressão no balonete abaixo da pressão capilar da traquéia (30-35 mmHg), em um patamar entre 20 e 30 mmHg, de modo a se obter um balonete distendido uniformemente, criar a vedação do escape de ar dos pulmões pela traquéia e evitar a aspiração pulmonar.
Abud (2001) em estudo de intubação orotraqueal em cães, com o uso de tubo provido de válvula reguladora de pressão no balonete (Lanz® ), sob pressão de 25 mmhg durante o período de 3 horas, não se impediu a ocorrência de erosão epitelial traqueal de média intensidade, observada em microscopia óptica, nem de alterações ciliares observadas à microscopia eletrônica de varredura. De acordo com a autora, esses achados determinam como valor crítico à pressão de 25 mmHg no balonete para se evitar a ocorrência de lesão da mucosa traqueal, ainda assim é considerado um valor elevado. (CASTILHO et al., 2003).
De acordo com Peña et al. (2004), Seegobin (1984) e Mendes (1996), recomendam que a pressão do balonete situe-se entre 20–25 mmHg. Pressão maior que 20 mmHg evita a aspiração gástrica com segurança, considerando-se 15 mmHg como limite mínimo, abaixo do qual poderia ocorrer broncoaspiração, e pressão maior que 25 mmHg já comprometeria a perfusão da mucosa traqueal.
Castilho et al. (2003), realizaram um estudo em cães com o objetivo de analisar as lesões traqueais decorrentes dos balonetes. Avaliaram pressões entre 9 e 19 mmHg, as quais foram suficientes para prevenir escape de ar ao redor do balonete e observaram que neste níveis pressóricos os balonetes causaram lesões mínimas na traquéia.
De acordo com Collins (1978), a quantidade de ar a ser insuflada nos balonetes de alto volume residual e baixa pressão não deve ser menor que 4 ml e não deve ser superior a 8 ml.
Segundo Barbosa e Santos (1996), poucos autores fazem referência à quantidade de ml de ar a ser insuflada no balonete de modo a manter a sua pressão em níveis que não comprometam a irrigação traqueal. Portanto, realizaram estudo para tentar estimar o volume de ar necessário no balonete, para cada diâmetro de tubo, de modo que a pressão do balonete não ultrapassasse de 20 a 30 mmHg. Concluíram que a quantidade de ar necessária varia de acordo com o diâmetro da cânula. Sendo assim, cânulas com 7.0, 7.5, 8.0, 8.5 e 9.0 devem ser insufladas com 4.0, 4.0, 4.0, 5.0 e 5.0 ml respectivamente, ou seja, quanto maior o diâmetro da cânula maior à quantidade de ar a ser injetado no balonete.
Peña et al (2004), também relatam que Reader (1985) e Bernhard (1982), consideram que vários fatores influenciam a pressão do balonete, entre eles o tipo e o tamanho do tubo traqueal, o volume injetado no balonete e a mistura de gases administrada ao paciente. O uso de N2O na mistura inalada leva à difusão do mesmo para dentro do balonete, esta difusão, é diretamente proporcional ao tempo de administração da mistura e inversamente proporcional à espessura do balonete.
Braz et al. (1999), assim como Reader e Bernhard, observaram em experimento com pacientes submetidos a intubação para procedimento cirúrgico e anestesiados com N2O, elevada pressão no balonete, mostrando como este gás se difunde facilmente para dentro do balonete e alertando para o controle continuo da pressão pelos anestesistas durante as cirurgias a fim de se evitar lesão da mucosa traqueal.
A pressão do balonete abaixo de 30 mmHg está associada a melhor suprimento sanguíneo e melhor conservação da histologia da traquéia do que pressões mais altas (NORDIN, 1977).


FTA. ANDRESSA ANDREO